quarta-feira, 13 de março de 2013

JURISDIÇÃO, AÇÃO E PROCESSO

Bom dia concurseiros,
 
Para dar início aos nossos estudos de Direito Processual Civil, selecionei três temas muito cobrados em concursos públicos/exames da ordem, por constituírem o verdadeiro alicerce do direito processual: a jurisdição, a ação e o processo.

Lembrando que este post foi elaborado com a finalidade de auxiliar nos estudos para a realização de provas objetivas.

No caso de questões discursivas, o estudo deverá ser aprofundado.

Espero que gostem.

Juliana Carvalho.


Introdução:

A JURISDIÇÃO é inerte, de modo que o Estado somente poderá exercer essa função se for provocado. Essa provocação se dá através da propositura de uma AÇÃO. Com a propositura da ação, o Estado precisa de um instrumento que lhe permita exercer a função jurisdicional, tal instrumento é o PROCESSO.
 
 
1. Da Jurisdição:
 
1.1. Conceito: é uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em disputa para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça.
 
Nas palavras de Antônio Cláudio da Costa Machado: "Jurisdição é o poder do Estado de solucionar ou dirimir conflitos de interesses com vista à pacificação da sociedade".
 
Muito esclarecedora é a explicação de Fredie Didier: "Jurisdição  é a função atribuída a um terceiro imparcial de realizar o Direito de modo imperativo e criativo, reconhecendo/efetivando/protegendo situações jurídicas concretamente deduzidas, em decisão insuscetível de controle externo e com aptidão para tornar-se indiscutível".

 
1.2. Principais Características da Jurisdição:
 
a) Substitutividade: ao exercer a jurisdição, o Estado substitui a vontade das partes e determina a solução do problema apresentado. De acordo com Chiovenda: "Exercendo a jurisdição, o Estado substitui, com uma atividade sua, as atividades daqueles que estão envolvidos no conflito trazido à apreciação".
 
b) Lide: a jurisdição pressupõe a existência de um conflito de interesses que será levado à apreciação do Judiciário.
 
c) Inércia: a jurisdição é inerte, o Estado só poderá exercer a função jurisdicional se provocado.
O art. 2º do CPC dispõe o seguinte: "Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou interessado a requerer, nos casos e formas legais".
 
d) Definitividade: Somente os atos jurisdicionais são suscetíveis de se tornarem imutáveis. Só uma decisão judicial pode tornar-se indiscutível e imutável pela coisa julgada material.
 
e) Imperatividade: A decisão do juiz tem força de lei entre as partes.
 
# Importante - Fredie Didier elenca mais uma característica para a jurisdição, a criatividade: "a função jurisdicional é criativa: cria-se a norma jurídica do caso concreto, bem como se cria, muita vez, a própria regra abstrata que deve regular o caso concreto".
 
 
1.3. Princípios Inerentes à Jurisdição:
 
a) Princípio da Investidura: a jurisdição só deve ser exercida por quem tenha sido regularmente investido na autoridade de juiz.
 
b) Princípio da Aderência ao Território: os juízes só têm autoridade nos limites territorias do seu Estado, ou seja, nos limites do território de sua jurisdição.
 
c) Princípio da Indelegabilidade: o exercício da função jurisdicional não pode ser delegado.
 
d) Princípio da Inevitabilidade: as partes devem submeter-se à decisão do órgão jurisdicional.
A partir do momento em que provocaram o exercício da função jurisdicional do Estado, a situação de ambas as partes perante o Estado-Juiz é de sujeição.
 
e) Inafastabilidade da Apreciação pelo Judiciário: prescreve o inciso XXXV, art. 5º da CF: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". 
 
f) Juiz Natural: ninguém será processado, senão pela autoridade competente (art. 5º, LIII da CF/88). Não haverá juízo ou Tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII da CF/88).
 
 
1.4. Jurisdição Contenciosa e Voluntária:
 
a) Jurisdição Contensiosa (ou, jurisdição propriamente dita): se dá quando há um conflito de interesses levado à apreciação do Estado-Juiz.
 
b) Jurisdição Voluntária (ou, jurisdição integrativa): é uma atividade estatal de integração e fiscalização. Muito embora não haja conflito de interesses, o Estado-Juiz  deve intervir exercendo uma atividade meramente homologatória, verificando se houve a observância das normas jurídicas na realização do ato jurídico, para que seus efeitos jurídicos sejam alcançados.
Hipóteses exemplificativas de jurisdição voluntária: homologação de divórcio consensual (após emenda 66/10), abertura de testamento e codicilo, herança jacente, declaração e divisão de bens do ausente, curatela dos interditos.
Importante: fazer a leitura dos arts. 1.103 a 1.210 do CPC.
 
# Para facilitar os estudos - Quadro comparativo entre jurisdição contenciosa e voluntária: 
 
Jurisdição Contenciosa

Jurisdição Voluntária

Inicia-se mediante provocação.

Inicia-se mediante provocação

Existência de lide.

Acordo de vontades.

A jurisdição atua resolvendo o litígio (substitutividade).

A jurisdição integra o negócio jurídico para lhe dar validade.

Existência de partes.

Existência de interessados.

A decisão faz coisa julgada.

A decisão não faz coisa julgada (art. 1.111, CPC).
 
 
2. Ação:
 
2.1. Conceito: é um direito subjetivo (cada pessoa o titulariza, individualmente) público (dirigido contra o Estado), autônomo (sua existência independe do direito material), abstrato (é exercido mesmo que a sentença seja desfavorável ao autor) e condicionado (seu exercício depende da presença das condições da ação) de exigir do Estado a prestação jurisdicional em um caso concreto.

 
2.2. Condições da ação o direito constitucional de ação tem o seu exercício condicionado pela presença das chamadas "condições da ação". A falta de qualquer delas leva à carência da ação e obsta o julgamento do mérito da causa. São elas:
 
a) Legitimidade das partes: deve haver um vínculo entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada, que lhes autorize a gerir o processo em que será discutida.
 
Nas palavras de Fredie Didier: "a todos é garantido o direito constitucional de provocar a atividade jurisdicional. Mas ninguém está autorizado a levar a juízo, de modo eficaz, qualquer pretensão, relacionada a qualquer objeto litigioso. Impõe a existência de um vínculo entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada, que lhes autorize a gerir o processo em que esta será discutida. Surge então a noção de legitimidade ad causam".
 
Classificação:
 
a.1) Legitimado Ordinário: aquele que defende em juízo direito próprio (é a regra do CPC).
a.2) Legitimado Extraordinário (ou substituto processual): é aquele que defende em nome próprio direito alheio.
A legitimação extraordinária é excepcional e só é possível nos casos previstos em lei.
O legitimado extraordinário atua no processo na qualidade de parte e não de representante.
Hipóteses: legitimidade do condômino, em defesa de propriedade comum ou condomínio; do Ministério Público, na defesa de interesses individuais ou homogêneos dos consumidores.
 
#Atenção: Não confundir substituição processual com representação processual:
 
representação processual quando um sujeito está em juízo em nome alheio, defendendo direito alheio (o representante processual não é parte, parte é o representado). O representante legal atua em juízo para suprir a incapacidade da parte.Ex: Numa ação de alimentos proposta por um filho incapaz, o pai ou a mãe pode ser seu representante processual.
 
substituição processual quando o sujeito age em nome próprio na defesa de interesse alheio, somente nos casos autorizados por lei (o substituto processual é parte).
 
b) Interesse de agir: consiste na NECESSIDADE de obter uma providência jurisdicional para alcançar o resultado útil previsto no ordenamento jurídico em seu benefício. Ou seja, a prestação jurisdicional, em cada caso concreto, deve ser NECESSÁRIA e ADEQUADA.
Necessária: diante da impossibilidade de se obter a satisfação do alegado direito sem a interferência do Estado-Juiz.
Adequada: o provimento solicitado deve ser o adequado para a produção do resultado almejado.
 
c) Possibilidade jurídica do pedido:  o pedido deverá consistir em uma pretensão que esteja, ao menos em tese, prevista no ordenamento jurídico, ou que não seja vedada.
Exemplos de pedidos juridicamente impossíveis: pedido de penhora de bens pertencentes ao Estado; pedido de pagamento de dívidas oriundas de jogos ou apostas.

 
2.3. Carência da ação: A ausência de qualquer das condições da ação enseja o que se denomina "carência da ação".
A carência da ação é matéria de ordem pública, portanto pode ser conhecida de ofício pelo magistrado, a qualquer tempo e grau de jurisdição.
Conhecida a carência da ação, o processo será extinto sem resolução do mérito, nos termos do inciso VI do art. 267 do CPC.
 
# Dica: mesmo sendo matéria de ordem pública, se o réu não alegar a carência da ação na primeira oportunidade em que caiba falar nos autos (contestação), responderá pelas custas de retardamento (art. 267, §3º, CPC).

 
2.4. Elementos da ação: a ação se individualiza por seus elementos constitutivos:
 
a) Partes: pessoas que participam do contraditório perante o Estado-Juiz (autor e réu).
 
b) Pedido: o objeto da ação é o pedido do autor.
 
Classificação:
b.1) Pedido imediato: é a providência jurisdicional que se pretende - a condenação, a expedição de ordem, a constituição de uma nova situação jurídica.
b.2) Pedido mediato: é o bem da vida pleiteado, o resultado prático que o demandante espera conseguir com a tomada daquela providência.
 
c) Causa de Pedir: o autor deve indicar os fatos e os fundamentos jurídicos que embasam o seu pedido.
c.1) Causa de pedir remota: são os fatos constitutivos do pedido.
c.2) Causa de pedir próxima: são os fundamentos jurídicos que justificam o pedido.

 
2.5. Identificação das Ações: duas ações são idênticas, semelhantes ou totalmente diferentes dependendo dos seus elementos: parte, pedido e causa de pedir.
 
Assim, pela análise dos elementos da ação é possível constatar alguns fenômenos processuais:
 
a) Litispendência: ocorre quando estão em curso duas ações idênticas, com as mesmas partes, pedido e causa de pedir. O segundo processo deve ser extinto sem resolução do mérito (art. 267,V, CPC).
 
b) Coisa Julgada: ocorre quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. No caso da coisa julgada, a ação anterior já foi decidida em caráter definitivo. O segundo processo também será extinto sem resolução do mérito (art. 267, V, CPC).
 
c) Perempção: é a perda do direito de ação, quando o autor, por três vezes consecutivas, dá causa a extinção de processos idênticos, por abandono (art. 268, parágrafo único, CPC). Verificada a perempção o processo será extinto sem resolução do mérito (art. 267, V, CPC).
 
d) Conexão: ocorre quando duas ou mais causas têm o mesmo PEDIDO ou a mesma CAUSA DE PEDIR. Determina a lei que, havendo ações conexas tramitando em separado, o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, poderá ordenar a reunião dessas ações, a fim de que sejam decididas simultaneamente. A reunião dessas ações atendem ao princípio da economia processual e à necessidade de se evitar decisões contraditórias.
Ex: Recente julgado do TJ/MG tratou de um caso de conexão (mesma causa de pedir). Vejamos:
Foram propostas duas ações revisionais de alimentos. 1) O pai pleiteava a redução o valor da pensão. 2) Já o filho pretendia a majoração. Houve a reunião das causas conexas perante o mesmo juízo, mas, mesmo assim, foi verificada contradição entre as sentenças, o que motivou a anulação.

AÇÕES REVISIONAIS DE ALIMENTOS - CONEXÃO - REUNIÃO DOS PROCESSOS - AUSÊNCIA DE JULGAMENTO SIMULTÂNEO - DECISÕES CONTRADITÓRIAS - CONFIGURAÇÃO - SENTENÇAS ANULADAS. - A reunião de causas conexas, num mesmo juízo, tem como escopo, justamente, permitir o processamento e julgamento simultâneos das demandas, a fim de evitar que sejam dadas soluções contraditórias a questões decorrentes de uma mesma relação jurídica material. - Verificada contradição entre as sentenças, julgadas separadamente, caso é de anulação. (MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 1.0024.08.125869-1/001 1258691-19.2008.8.13.0024 (1). Relator: Des.(a) Eduardo Andrade. Data do Julgamento: 25/01/2011).

IMPORTANTE: Súmula 235 do STJ - "A conexão não determina a união dos processos, se um deles já foi julgado".
 
e) Continência (para memorizar: uma ação contém a outra):  ocorre quando há, em duas ou mais ações, IDENTIDADE DE PARTES e DA CAUSA DE PEDIR, mas o pedido de uma é mais amplo que o da outra (art. 104 do CPC). As demandas continentes serão reunidas a fim de que seja julgadas simultâneamente. 


3. Processo: é o instrumento por meio do qual a jurisdição se opera.

3.1. Pressupostos processuais: são requisitos mínimos necessários à existência e desenvolvimento válido e regular do processo. A ausência de um pressuposto processual impõe a extinção do feito sem resolução do mérito.


3.2. Classificação (citada por Fredie Didier, baseada na obra de José Orlando Rocha de Carvalho):

a) Pressupostos de Existência:

Subjetivos:

a.1) Juiz (Jurisdição): a demanda deve ser ajuizada perante um órgão do Estado apto ao exercício da função jurisdicional, ainda que incompetente. Pondera Fredie Didier: "Considera-se inexistente o processo se a demanda for ajuizada perante não-juiz e decisão prolatada por não-juiz é uma não-decisão, é apenas um simulacro a que não se pode emprestar qualquer eficácia jurídica."

a.2) Capacidade de ser parte: é a aptidão para, em tese, ser sujeito da relação jurídica processual.

Objetivos:

a.3) Existência de demanda: a parte autora deve requerer a instauração do processo mediante a formulação do pedido inicial.

b) Pressupostos de Validade:

Subjetivos:

b.1) Juiz competente e imparcial.

b.2) Capacidade processual: é a aptidão para praticar atos processuais, independente de assistência ou de representação, pessoalmente, ou por pessoas indicadas pela lei. A falta de capacidade processual é sempre sanável, nos termos do art. 13 do CPC.

b.3) Capacidade Postulatória: a parte deve estar sempre representada por advogado regularmente constituído.

Objetivos:

b.4)  Pressupostos Intrínsecos: podem ser resumidos no "respeito ao formalismo processual". Ex: petição inicial apta, citação válida, respeito ao contraditório, adoção do procedimento adequado, obediência ao procedimento.

b.5) Pressupostos Extrínsecos (ou negativos):  São fatos que NÃO PODEM OCORRER, para que o procedimento se instaure validamente. São exemplos: a perempção, litispendência, coisa julgada, convenção de arbitragem, etc.


3.3. Para facilitar a memorização:

Pressupostos de Existência
Subjetivos
Objetivos
JUIZ - Jurisdição: a demanda deve ser proposta perante órgão investido da função jurisdicional.
Existência da demanda (petição inicial).
PARTE- Capacidade de ser parte.
 


Pressupostos de Validade
Subjetivos
Objetivos
JUIZ- Juiz competente e imparcial.
Intrínsecos
Extrínsecos (ou, negativos)
PARTE- Capacidade processual e capacidade postulatória.
Respeito ao formalismo processual.
Ausência de perempção, litispendência, coisa julgada, convenção de arbitragem, etc.



3.4. Matéria de Ordem Pública: os pressupostos processuais são considerados matérias de ordem pública. Assim, o juiz poderá, de ofício e a qualquer tempo e grau de jurisdição, verificar a ausência dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo e extinguir o feito sem resolução do mérito.



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